segunda-feira, 27 de junho de 2011

O navio do deserto




Com freqüência eu era transportado pelo navio do deserto – sem fardo algum-, para além dos portões da cidade santa, necessitava de alivio e paz, e simplesmente, como qualquer pessoa, considero a movimentação dos peixes, das ovelhas e principalmente de Damasco inapropriada para a consumação desse desejo.
Então percorri a margem dos poços de Salomão, abriguei-me debaixo de uma romeira e dessa benção que D’us prometeu a Moises tomei do seu fruto santo.
Devido ao calor, desfiz a dobra diagonal que me cercava a cabeça, e para que não houvesse mais queixas do furor bravio do sol, troquei o couro de hiena - que me efervescia os pés-, por enregeladas sandálias romanas.
E perto do meu telúrico céu via-se judeus cantando e gritando enquanto pisavam alegres no lagar – era o inicio do ano-. Com ternura as uvas eram laceradas pelos pés descalços, isso para que o alvo de sua moléstia escorresse até atingir o tanque menor, e ali ficaria por um longo período.
Diminuindo a euforia hebréia, os olhos escolheram cena mais mansa, e assim fizeram. Sobre um amontoado de pedras – me parecia o inicio de uma casa sem futuro promissor- descansava com extrema fadiga, um cabrito montês, que sem insistência alguma entregou se ao sono, e num gesto de inveja da mesma forma meus olhos procederam.
No mover do tempo o demônio do meio-dia revela-se. A maciez dos pensamentos escorria para um abismo vazio. O rosto que outrora ostentava harmonia e extrema satisfação pelas obras do Divino Artífice agora se afoga na triste monotonia. Temeroso com o avançar do tédio, regressei à minha alcova e voltei à atenção para o que tanto me apraz, no intuito de amainar o espírito subir a escada dos sonhos.


Um comentário:

  1. Apartir desse texto eu iria escrever meu primeiro Romance... Fiquei sem tempo. Aff...

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